Eu nunca menti, não minto nunca e vou contar uma realidade que aconteceu comigo. Já faz muito tempo, uns 64 anos. Eu era um rapazinho de 16 anos, mais ou menos, e arrumei uma namorada lá para os lados de Poções, em Maracaia.
Fiquei com ela até 11 horas, despedi e saí para ir embora. Estava ventando muito. Como naquela época ninguém tinha carro, eu estava montado em uma mula preta de nome Marreta, que foi do Edmundo Curraleiro.
Quando já aproximava de Congonhas, já era quase meia noite e ventava muito. Ouvi uma música e assustei, fiquei com muito medo mesmo. A besta parou, esticou as orelhas e não andava mais. Não tinha casa perto, muito menos aparelho de som.
A música tocava assim: “Eu tava na peneira, eu tava…’ E parava.
Quanto mais ventava, mais a música repetia: “Eu tava na peneira, eu tava”. Até meu chapéu levantava da cabeça. Eu gritei bem alto e forte: “Se for alguém que estiver fazendo medo em mim, pode sair do esconderijo que eu vou dar tiro pra tudo quanto é lado!”
Ninguém apareceu, e a música continuava repetindo. A mula permanecia empacada, eu precisava tirar leite cedo e não podia voltar e pedir pousada. Aí eu pensei: “seja o que Deus quiser”. Apiei e amarrei a mula em um pé de pequi que existe até hoje. Tirei a lanterna e o revólver do bolso do arreio e entrei pelo matagal.
Fui abrindo os ramos com o cano do revólver, até que encontrei uma moita de gravatá e bati a lanterna lá. Vocês não imaginam o que eu encontrei: um pedaço de disco. Toda vez que ventava, o espinho do gravatá passava por cima do disco e tocava o mesmo pedaço da música: “Eu tava na peneira, eu tava…” Como o disco estava quebrado, parava aí.
O medo acabou na hora. Peguei o pedaço de disco, coloquei no bolso e montei de novo na mula, que também já estava mais calma. Chegando no córrego da Forquilha, joguei o pedaço de disco lá dentro e falei:
– Se algum mandi não passar o ferrão, você não vai fazer medo em mais ninguém”. E foi verdade.
Por: Marçalino Soares Branco
Publicado por: Renato Alves