Por: Eustáquio Márcio de Oliveira, cooperado, ex-presidente da Cooperabaeté
Com a experiência de produtor de leite há quase quatro décadas, não é difícil saber que o mercado de lácteos tem como uma de suas características a instabilidade. Como se trata de um alimento popular muito importante, as eventuais crises sociais afetam muito esse mercado. Mas o que era instabilidade passageira se transformou em barreira quase intransponível para os produtores se manterem na atividade.
Claro, houve uma pandemia que durou mais de dois anos, a economia mundial foi virada de ponta a cabeça, a renda das famílias caiu e, com ela, o consumo de certos alimentos. A despeito da superação de grande parte desses problemas oriundos da época da pandemia, o mercado de leite e seus derivados fica a cada dia mais difícil, pelo menos na nossa região. De vez em quando, tem a concorrência dos produtos importados, muitas vezes, de países que pagam subsídios aos seus produtores.
Agora, além da necessidade de enfrentar as adversidades citadas, os produtores da região de atuação da Cooperabaeté enfrentam também um problema de descumprimento de lei importante na equalização das forças do segmento. Esse problema é muito grave, porque transfere ao produtor, elo mais fraco da corrente, todo o ônus das instabilidades do mercado dos derivados do leite.
Para se entender o quanto é absurda a situação do produtor de leite, vale questionar: será que existe outro ramo da indústria em que o preço da matéria prima somente seja definido, de forma unilateral, pela fabricante, um mês depois de recebida na fábrica, processada e, certamente, vendida?
A norma descumprida, sistematicamente, pela indústria do laticínio é a Lei INSTABILIDADE E IRREGULARIDADE Eustáquio Márcio de Oliveira, cooperado, ex-presidente da Cooperabaeté 12.669, de 19 de julho de 2012, que determina, textualmente: “Fica obrigada a empresa de beneficiamento e comércio de laticínios a informar ao produtor de leite o preço pago pelo litro do produto, até o dia 25 mês anterior à entrega”. Parágrafo único: “A não-informação penalizará a empresa de beneficiamento e comércio de laticínio a pagar o maior preço praticado no mercado”.
Essa lei é muito importante, porque permite que o produtor possa se planejar, para produzir dentro dos limites razoáveis que o mercado lhe permite. Do contrário, quando ele não sabe o preço da sua produção, não consegue, muitas vezes, evitar significativas perdas, porque entrega seu produto durante todo mês e, normalmente, é informado do preço no quinto dia do mês seguinte.
A indústria de laticínios costuma burlar essa lei, enviando à Cooperativa uma correspondência em que atribui ao preço a ser pago no mês seguinte um valor irrisório, como parcela fixa, seguida de vários outros itens que são chamados de variáveis e, por isso, não informados.
Na realidade, não procede essa informação, porque o que pode variar com frequência são os itens que compõem a qualidade do leite e, raramente, a escala de produção.
Então, para reforçar, a lei determina a informação ao produtor, ou seja, informação direta. A lei manda informar o preço, que significa o valor efetivamente pago pelo produto, e não uma equação ou um enigma. Bastaria a mensagem: preço do leite no próximo mês – x reais, mantidos os mesmos parâmetros variáveis. Simples assim.
De fato, essa prática, além de ilegal, porque descumpre uma lei, é muito injusta e danosa aos produtores do leite, que, no seu dia a dia, já enfrentam muitas adversidades, como as irregularidades climáticas, os elevados preços de insumos, a própria instabilidade dos preços dos produtos lácteos, além de várias outras.
Para se entender o quanto é absurda a situação do produtor de leite, vale questionar: será que existe outro ramo da indústria em que o preço da matéria prima somente seja definido, de forma unilateral, pela fabricante, um mês depois de recebida na fábrica, processada e, certamente, vendida?
Em agosto de 2022, os produtores da Cooperativa dos Produtores Rurais de Abaeté e Região Limitada, mais uma vez, não souberam, dentro do mês, o preço do leite durante os trinta e um dias do mês. A desagradável surpresa somente foi descoberta no dia cinco de setembro, quando o caos já estava instalado. A queda foi brutal, tardia e estranha, porque, em julho, também tardiamente, o preço veio com um significativo aumento e com uma bonificação por acréscimo de produção. Ou seja, a indústria queria mais leite para o mês de agosto. Os produtores acreditaram nisso.
É possível e provável que tenha havido queda nas vendas dos produtos lácteos, a partir de meados do mês de agosto. Então, se a norma tivesse sido cumprida, com a informação devida aos produtores, a indústria, no mínimo, dividiria com o setor primário o ônus da queda de preços. Do contrário, como o produtor não foi informado no tempo da lei, a fabricante pode transferir esse custo aos integrantes do elo fraco da corrente.
Não é preciso ser muito inteligente, nem grande conhecedor do Direito, para entender que essa é uma prática injusta de comércio e que ela não se sustenta diante de um questionamento na justiça.
Então fica aqui um resumo singelo da catástrofe e a proposta à diretoria da Cooperativa, para que, a seu critério, adote as necessárias medidas para melhorar essa situação.
Cooperabaeté, uma cooperativa que fazemos juntos.
Publicado por: Renato Alves