Num dos momentos mais difíceis de sua vida, o velório do pai, Sueli Alves conta que ouviu algumas pessoas murmurando: “essas meninas vão perder tudo em cinco anos”, “não dou três anos para acabarem com todo o patrimônio que ele levou a vida toda pra construir”. Doze anos depois, a caçula do casal Maria Antônia Ferreira e Bruno Alves destaca-se na criação de bezerros nelore, inseminando 500 cabeças por ano, na Fazenda Quati, que recebeu de herança, e em outras três que aluga, registrando um faturamento de sete dígitos anuais.
A mesma trajetória de superação, empreendedorismo e sucesso é vivenciada pelas irmãs Simone e Sandra. “Enfrentamos muitos desafios, caímos muitas vezes, mas o principal legado que recebemos foi a força pra continuar, pra persistir, pra lutar. Gerir fazenda é complicado, principalmente para mulheres, mas, quando a gente percebe que é capaz, é uma força muito grande que vem. E é muito gratificante saber que somos capazes, que estamos valorizando o que nossos pais deixaram pra nós com tanto carinho, com tanto esforço”, destaca Sandra, mãe de quatro filhos, proprietária das fazendas Cubatão, Mata da Oncinha e Gamelão, onde cria gado de corte, com apoio do filho e gerente Artur.
Simone e Sandra contam que, desde a infância, tinham a paixão pela vida no campo, o sonho de dar continuidade ao trabalho do pai. “Só que, na época, mulher no agronegócio não era de bom tom, estava contra as normas da sociedade uma mulher gostar de serviço de homem. Meu pai sempre falava: você tem que estudar, o meu maior presente para vocês não vai ser dinheiro, a minha herança para vocês vai ser o estudo que vocês vão ter”, recorda Simone, que cursou Direito em BH e voltou pra Abaeté depois que a mãe faleceu.
Foi quando conheceu, se casou com Thiago e realizou o sonho de trabalhar junto com o pai na fazenda. “Meu pai, muito sábio, muito inteligente, foi o meu mentor de vida. Ele nos chamou para ser sócios dele, trabalhar com gado de leite em uma das fazendas. Começamos com 200 litros/dia e chegamos a produzir 2.000, com ajuda da Cooperativa, do Ruda no Projeto Educampo, do veterinário Gabriel Lima, que nos acompanha até hoje”, conta Simone.
“Infelizmente, nem tudo é como a gente acha que deveria ser, e mais uma fatalidade aconteceu. Nosso pai faleceu, nos deixando sem chão, um baque enorme. Como não sou de desistir, como nos ensinaram a persistir, a querer crescer, melhorar, a sempre buscar conhecimento e parcerias, assim fizemos. Viemos pra Fazenda Careta, onde o relevo é acidentado e, como não tinha como continuar com leite, nós partimos para o gado de corte”, completa Simone, apaixonada pelos resultados dos investimentos em pastagem e genética, na busca de melhor qualidade, beleza e docilidade para o gado nelore e angus americano.
Além de força, coragem e empreendedorismo, as três irmãs são um exemplo de união, de respeito e parceria. “As pessoas costumam brigar por herança, e nós nos unimos mais ainda para valorizar aquilo que nossos pais nos ensinaram. Mesmo que a gente mude o fazer, que inove nos negócios, os princípios que seguimos são os mesmos deles, de respeito, de união, de honestidade, de amor, de uma pedir opinião para outra quando vai fazer um negócio, de parceria das três. A parceria começa entre a gente e daí se amplifica. Isso é muito lindo, muito gostoso de ver”, ressalta Sueli.
E ela confessa: “O sonho da minha mãe e do meu pai era ter um filho homem, porque achavam que só um homem poderia dar continuidade a tudo o que eles tinham. Eu era a última esperança desse filho homem vir, e cresci com aquela crença de incapacidade, de rejeição. Como, na visão deles, menina tinha que ir embora pra estudar, fiz Agronomia, Administração de Empresas, Enfermagem, sempre insatisfeita, enfrentando crises de depressão, síndrome do pânico e outras. Quando meu pai faleceu e nós tivemos que administrar a herança, fiz muita terapia, muito trabalho de autoconhecimento pra me fortalecer, pra descobrir o meu valor. Contei com muita ajuda, a parceria das irmãs, do marido, da Cooperabaeté, do Sicoob Credinacional, do Sindicato Rural, onde eu me orgulho de estar há 10 anos na diretoria, graças a Deus, com muita coragem, com muito ânimo. E não é pra provar para meus pais que mulher é capaz. Eu honro meus pais sendo feliz, com sucesso e prosperidade, com ajuda das minhas irmãs, dos colaboradores, dos parceiros, ao lado dos filhos. É muito bom saber e mostrar que nós, mulheres, temos valor, temos nosso lugar no agro”, finaliza Sueli.
Publicado por: Renato Alves